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Olá amigos!

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segunda-feira, 11 de junho de 2012

Comunicação



Luís Fernando Veríssimo

É importante saber o nome das coisas. Ou, pelo menos, saber comunicar o que você quer. Imagine-se entrando numa loja para comprar um... um... como é mesmo o nome?
- Posso ajudá-lo, cavalheiro?
- Pode. Eu quero um daqueles, daqueles...
- Pois não?
- Um... como é mesmo o nome?- Sim?
- Pomba! Um... um... Que cabeça a minha. A palavra me escapou por completo. É uma coisa simples, conhecidíssima.
- Sim senhor.
- O senhor vai dar risada quando souber.
- Sim senhor.
- Olha, é pontuda, certo?
- O quê, cavalheiro?
- Isso que eu quero. Tem uma ponta assim, entende? Depois vem assim, assim, faz uma volta, aí vem reto de novo, e na outra ponta tem uma espécie de encaixe, entende? Na ponta tem outra volta, só que esta é mais fechada. E tem um, um... Uma espécie de, como é que se diz? De sulco. Um sulco onde encaixa a outra ponta, a pontuda, de sorte que o, a, o negócio, entende, fica fechado. É isso. Uma coisa pontuda que fecha. Entende?
- Infelizmente, cavalheiro...
- Ora, você sabe do que eu estou falando.
- Estou me esforçando, mas...
- Escuta. Acho que não podia ser mais claro. Pontudo numa ponta, certo?
- Se o senhor diz, cavalheiro.
- Como, se eu digo? Isso já é má vontade. Eu sei que é pontudo numa ponta. Posso não saber o nome da coisa, isso é um detalhe. Mas sei exatamente o que eu quero.
- Sim senhor. Pontudo numa ponta.
- Isso. Eu sabia que você compreenderia. Tem?
- Bom, eu preciso saber mais sobre o, a, essa coisa. Tente descrevê-la outra vez. Quem sabe o senhor desenha para nós?
- Não. Eu não sei desenhar nem casinha com fumaça saindo da chaminé. Sou uma negação em desenho.
- Sinto muito.
- Não precisa sentir. Sou técnico em contabilidade, estou muito bem de vida. Não sou um débil mental. Não sei desenhar, só isso. E hoje, por acaso, me esqueci do nome desse raio. Mas fora isso, tudo bem. O desenho não me faz falta. Lido com números. Tenho algum problema com os números mais complicados, claro. O oito, por exemplo. Tenho que fazer um rascunho antes. Mas não sou um débil mental, como você está pensando.
- Eu não estou pensando nada, cavalheiro.
- Chame o gerente.
- Não será preciso, cavalheiro. Tenho certeza de que chegaremos a um acordo. Essa coisa que o senhor quer, é feito do quê?
- É de, sei lá. De metal.
- Muito bem. De metal. Ela se move?
- Bem... É mais ou menos assim. Presta atenção nas minhas mãos. É assim, assim, dobra aqui e encaixa na ponta, assim.
- Tem mais de uma peça? Já vem montado?
- É inteiriço. Tenho quase certeza de que é inteiriço.
- Francamente...
- Mas é simples! Uma coisa simples. Olha: assim, assim, uma volta aqui, vem vindo, vem vindo, outra volta e clique, encaixa.
- Ah, tem clique. É elétrico.
- Não! Clique, que eu digo, é o barulho de encaixar.
- Já sei!
- Ótimo!
- O senhor quer uma antena externa de televisão.
- Não! Escuta aqui. Vamos tentar de novo...
- Tentemos por outro lado. Para o que serve?
- Serve assim para prender. Entende? Uma coisa pontuda que prende. Você enfia a ponta pontuda por aqui, encaixa a ponta no sulco e prende as duas partes de uma coisa.
- Certo. Esse instrumentos que o senhor procura funciona mais ou menos como um gigantesco alfinete de segurança e...
- Mas é isso! É isso! Um alfinete de segurança!
- Mas do jeito que o senhor descrevia parecia uma coisa enorme, cavalheiro!
- É que eu sou meio expansivo. Me vê aí um... um... Como é mesmo o nome?

domingo, 10 de junho de 2012

domingo, 3 de junho de 2012

A Macieira Encantada



Era uma vez um reino antigo e pobre, situado perto de uma grande montanha.
Havia uma lenda de que, no alto dessa montanha havia uma Macieira mágica, que produzia maçãs de ouro. Para colher as maçãs era preciso chegar até lá, enfrentando todas as situações que aparecessem no caminho. Nunca ninguém havia conseguido essa façanha, conforme dizia a lenda.
O Rei do lugar resolveu oferecer um grande prêmio àquele que se dispusesse a fazer essa viagem e que conseguisse trazer as maçãs, pois assim o reino estaria a salvo da pobreza e das dificuldades que o povo enfrentava. O prêmio seria da escolha do vencedor e incluía a mão da princesa em casamento.
Apareceram três valorosos e corajosos cavaleiros dispostos a essa aventura tão difícil.
Eles deveriam seguir separados e, por coincidência, havia três caminhos:
1º - rápido e fácil, onde não havia nenhum obstáculo e nenhuma dificuldade;
2º - rápido e não tão fácil quanto o primeiro, pois havia algumas situações a serem enfrentadas;
3º - longo e difícil, cheio de situações trabalhosas.
Foi efetuado um sorteio para ver quem escolheria em primeiro lugar um desses caminhos. O primeiro sorteado escolheu, naturalmente, o Primeiro caminho. O segundo sorteado escolheu o Segundo caminho. O terceiro sorteado, sem nenhuma outra opção, aceitou o Terceiro caminho.
Eles partiram juntos, no mesmo horário, levando consigo apenas uma mochila contendo alimentos, agasalhos e algumas ferramentas.
O Primeiro, com muita facilidade chegou rapidamente até a montanha, subiu, feliz por acreditar que seria o vencedor e quando se deparou com a Macieira Encantada sorriu de felicidade.
O que ele não esperava, porém, é que ela fosse tão inatingível. Como chegar até as maçãs? Elas estavam em galhos muito altos. Não havia como subir. O tronco era muito alto também. Ele não possuía nenhum meio de chegar até lá em cima.
Ficou esperando o Segundo chegar para resolverem juntos a questão.
O Segundo enfrentou galhardamente a primeira situação com a qual se deparou, porém logo em seguida apareceu outra, e logo depois mais uma e mais outra, sendo algumas delas um tanto difíceis de superar. Ele acabou ficando cansado, esgotado até ficar doente, e cair prostrado.
Quando se deu conta de seu péssimo estado físico, foi obrigado a retroceder e voltou para a aldeia, onde foi internado para cuidados médicos.

O Terceiro teve seu primeiro teste quando acabou sua água e ele chegou a um poço. Quando puxou o balde, arrebentou a corda e ele então, rapidamente, com suas ferramentas e alguns galhos, improvisou uma escada para descer até o poço e retirar a água para saciar sua sede.
Resolveu levar a escada consigo e também a corda remendada. Percebeu que estava começando a gostar muito dessa aventura.
Depois de descansar, seguiu viagem e precisou atravessar um rio com uma correnteza fortíssima. Construiu, então, uma pequena jangada e com uma vara de bambu como apoio, conseguiu chegar do outro lado do rio, protegendo assim sua mochila, seus agasalhos e todo o material que levava consigo para o momento que precisasse deles, incluindo a jangada.
Em um outro ponto do caminho ele teve de cortar o mato denso e passar por cima de grossos troncos. Com esses troncos ele fez rodas para facilitar o transporte do seu material, usando também a corda para puxar.
E assim, sucessivamente, a cada nova situação que surgia, como ele não tinha pressa, calmamente, fazendo uso de tudo o que estava aprendendo nessa viagem e do material que, prudentemente guardara, resolvia facilmente a questão.
A viagem foi longa, cheia de situações diferentes, de detalhes, e logo chegou o momento esperado, quando ele se defrontou com a Macieira Encantada.
O Primeiro havia se cansado de esperar e também retornara ao povoado.
O encanto da Macieira tomou conta do Terceiro.
Ela era tão linda, grande, alta, brilhante. Os raios do sol incidindo nos frutos dourados irradiavam uma luz imensa que o deixou extasiado. Quanto mais olhava para a luz dourada, mais ele se sentia invadir por ela, e percebeu que todo o seu corpo parecia estar também dourado.
Nesse momento ele sentiu como se uma onda de sabedoria tomasse conta de seu ser. Com essa sensação maravilhosa ele se deixou ficar, inebriado, durante longo tempo.
Depois do impacto ele se pôs a trabalhar e preparou cuidadosamente, seu material, fazendo uso de todos os seus recursos. Transformou a jangada numa grande cesta, para guardar as maçãs dentro, subiu na árvore, pela escada, usou o bambu para empurrar as maçãs mais altas e mais distantes.
Tudo isso e mais algumas providências que sua criatividade lhe sugeriu para facilitar seu trabalho, que havia se transformado em prazer.
Depois de encher a cesta com as maçãs, e com a certeza de que poderia voltar ali quando quisesse, por ser a Macieira pródiga, ele agradeceu a Deus por ter chegado, por ter conseguido concluir seu objetivo.
Agradeceu principalmente a si mesmo pela coragem e persistência na utilização de todos os seus recursos, como inteligência e criatividade.
Voltou pelo caminho mais fácil, levando consigo os frutos de seu trabalho e de seus esforços, frutos esses colhidos com muita competência e merecimento.
Descobriu, entre outras coisas que: Tudo que apareceu em seu caminho foi útil e importante para sua vitória;
cada uma das situações que ele resolveu, foi de grande aprendizado, não só para aquele momento, mas também para vários outros na sua vida futura;
quando você faz do seu trabalho um prazer, suas chances de sucesso são muito maiores;
quando seu objetivo vale a pena, não há nada que o faça desistir no meio do caminho;
a sua vitória poderia beneficiar a vida de muita gente e também servir de exemplo a outras pessoas, a quem ele poderia ensinar tudo o que aprendeu nessa trajetória.
O resto da história vocês podem imaginar. E como toda história que se preze, viveram felizes para sempre...

Um Olhinho, Dois Olhinhos, Três Olhinhos

Livro: OLHINHO, DOIS OLHINHOS, TRÊS OLHINHOS, UM

Era uma vez uma mulher que tinha três filhas. A mais velha chamava-se Olhinho, porque só tinha um olho no meio da testa; a segunda chamava-se Doisolhinhos, porque tinha dois olhos, como todo mundo; e a terceira chamava-se Trêsolhinhos, porque tinha três olhos: o terceiro estava no meio da testa.
Mas como Doisolhinhos era igual ao resto da humanidade, a mãe e as outras irmãs, detestavam-na. Por isso diziam:
- Tu, com os teus dois olhos, não és nada diferente da gente vulgar! Nada tens em comum conosco!
Viviam a enxotá-la de um lado para outro aos empurrões; atiravam-lhe os piores vestidos e, para se alimentar, davam-lhe as sobras de comida; torturavam-na, enfim, de mil maneiras.
Um belo dia, Doisolhinhos tinha que ir levar as cabras a pastar; mas estava fraca de tanta fome porque as irmãs lhe haviam deixado pouquíssimas sobras para comer. Então, sentou-se à borda do campo e pôs-se a chorar; chorou tanto que as lágrimas, escorrendo-lhe pelas faces, formaram dois regatos.
Enquanto estava assim chorando, deu com uma mulher na sua frente, que lhe perguntou:
- Por quê estás chorando?
Doisolhinhos respondeu:
- E não tenho razão para chorar? Só porque tenho dois olhos, como todo mundo, minha mãe e minhas irmãs detestam-me, empurram-me de um canto para outro, atiram-me vestidos velhos e dão-me apenas restos de comida para me alimentar. Hoje comi tão pouco, que estou morrendo de fome.
A mulher, que era uma feiticeira, então disse:
- Enxuga teus olhos, minha menina; vou dizer-te uma coisa, para que não padeças mais fome. É isto: basta que digas à tua cabrinha:
Linha cabrinha
põe a mesinha!
E logo surgirá à tua frente uma mesinha ricamente posta, coberta com o que há de melhor no mundo, e ninguém te impedirá de comer até te fartares. Assim que estiveres satisfeita, dize:
Linha cabrinha
tira a mesinha!
E a mesinha desaparecerá.
Dito isto, a feiticeira retirou-se e a mocinha ficou a pensar:
"Vou experimentar já fazer o que ela disse, para ver se é verdade, pois estou morrendo de fome!"
Dito e feito. Aproximou-se da cabra e disse:
Linha cabrinha
põe a mesinha!
Mal acabou de pronunciar essas palavras, surgiu a mesinha e, sobre a linda e alva toalha que a cobria, viu um talher e um prato, tudo de prata, e as mais diversas terrinas cheias de iguarias deliciosas, bem quentinhas, como se saíssem nesse momento do fogo.
Doisolhinhos ajoelhou-se e rezou uma oração bem curta, pois a fome não permitia mais:
"Senhor e Deus meu, que sejas o meu hóspede, agora e para sempre, Amém"
Em seguida, serviu-se e comeu com grande apetite. Depois de satisfazer-se, repetiu as palavras que lhe ensinara a feiticeira:
Linha cabrinha
tira a mesinha!
E a mesa, com tudo que tinha em cima, desapareceu.
"Oh, - pensou ela, muito feliz - essa é uma bela maneira de preparar a comida!"
À noitinha, quando regressou à casa levando a cabra, lá encontrou apenas um pratinho de barro, com o pingo de sobras deixado pelas suas irmãs; mas não tocou nele. No dia seguinte, tornou a levar a cabra a pastar, sem tocar nos restos que lhe deram para comer.
Ora, nas primeiras vezes isso não despertou a atenção das irmãs, mas, como o caso se repetisse, elas ficaram desconfiadas e disseram:
- Há coisa nisto! Doisolhinhos não toca mais na comida que antes devorava; decerto encontrou outra saída!
Para descobrir a verdade, Olhinho foi incumbida de segui-la ao campo e prestar atenção ao que ela fazia, e ver se alguém lhe dava a comida e a bebida.
Assim que a irmã se põs a caminho, Olhinho aproximou-se-lhe dizendo:
- Vou contigo ao campo; quero ver se cuidas bem das cabras e as deixas pastar convenientemente.
Doisolhinhos percebeu a intenção da irmã e uma vez no campo, levou a sua cabra para o meio de um capim muito alto e disse:
- Sentemo-nos aqui, Olhinho, quero cantar-te alguma coisa.
Olhinho sentou-se, pois estava muito cansada pela caminhada que dera e pelo calor que fazia; a irmã então pôs-se a cantar:
Olhinho, velas tu?
Olhinho, dormes tu?
e ela, fechando o olho, adormeceu. Certificando-se de que a irmã dormia realmente e não poderia revelar nada, Doisolhinhos chamou a cabra:
Linha cabrinha
põe a mesinha!
Comeu tudo o que quis, bebeu o que lhe apetecia, e tornou a dizer:
Linha cabrinha
tira a mesinha!
Imediatamente, desapareceu a mesa e tudo o que havia em cima dela. Em seguida, despertou a irmã dizendo:
- Olhinho, vieste tomar conta das cabras e ver se pastam o suficiente e acabas dormindo! Contigo, elas poderiam perder-se tranqüilamente! Vem, levanta-te vamos para casa.
Voltaram as duas para casa e também desta vez Doisolhinhos deixou intacto o prato de comida. Olhinho não pôde explicar à mãe a razão porque a irmã não comia, e desculpou-s dizendo:
- Eu nada vi; pois lá no campo, deu-me sono e eu dormi um pouco.
No dia seguinte, a mãe disse a Trêsolhinhos:
- Vai tu com a tua irmã e presta bem atenção se ela come alguma coisa, ou se alguém lhe dá o que comer e beber.
Quando Doisolhinhos se aprestava a sair com as cabras, Trêsolhinhos disse-lhe:
- Vou contigo; quero ver se cuidas bem das cabras e as deixas pastar bastante.
A irmã compreendeu a intenção dela e, chegando ao campo, levou a cabra para o meio do capim bem alto, depois disse:
- Sentemo-nos aqui, Trêsolhinhos, quero cantar-te alguma coisa.
Cansada pela caminhada e pelo calor, Trêsolhinhos sentou-se e a irmã pôs-se a cantar o seu estribilho:
Trêsolhinhos, velas tu?
Mas, ao invés de cantar:
Trêsolhinhos, dormes tu?
Cantou distraidamente:
Doisolhinhos, dormes tu?
E foi cantando distraidamente:
Trêsolhinhos, velas tu?
Doisolhinhos, dormes tu?
Então, dois olhos fecharam-se e dormiram, mas o terceiro ficou aberto, pois a canção não se dirigira a ele. Trêsolhinhos, astuciosamente, fechou-o como se estivesse dormindo realmente esse também. Entretanto, com ele espiava e enxergava tudo. Quando a irmã pensou que ela estivesse perfeitamente adormecida, pronunciou as palavras conhecidas:
Linha cabrinha
põe a mesinha!
Surgiu a mesa e ela comeu e bebeu fartamente, depois fez desaparecer tudo, dizendo:
Linha cabrinha
tira a mesinha!
Trêsolhinhos vira tudo. A outra aproximou-se; despertou-a e disse:
- Trêsolhinhos, adormeceste? Como guardas bem as cabras! Vem daí, vamos para casa.
Chegando a casa, Doisolhinhos não comeu nada; mas a irmã contou à mãe que uma cabra lhe servia a melhor comida, numa mesa magnífica.
A mãe, cheia de inveja e de ódio, gritou:
- Ah, queres passar melhor do que nós? Hás de perder esse gosto!
Foi buscar um facão de açougueiro e matou a cabra.
Vendo isso, Doisolhinhos saiu desesperada, foi sentar-se à borda do campo e desatou a chorar. Repentinamente surgiu à sua frente a feiticeira, dizendo:
- Por quê estás chorando, Doisolhinhos?
- E não tenho razão para chorar? Minha mãe matou a cabra que todos os dias me proporcionava tão gostosos alimentos; agora, voltarei a padecer fome!
- Vou dar-te um ótimo conselho; - disse a feiticeira. - Volta para casa, pede que te dêem os intestinos da cabra e enterra-o diante da porta; será a tua felicidade.
Dizendo isto desapareceu, e Doisolhinhos foi para casa.
- Queridas irmãs, - disse ela - dai-me alguma coisa da minha querida cabra! Não exijo o melhor; quero apenas os intestinos.
As irmãs puseram-se a rir desse estranho pedido e disseram:
- Podes pegá-los; já que não queres outra coisa!
À noite, quando estavam todas recolhidas, Doisolhinhos pegou os intestinos da cabra e, ocultamente, enterrou-os diante da porta da casa, tal como lhe aconselhara a feiticeira.
No dia seguinte, quando despertaram, as irmãs, chegando à janela, viram uma árvore estupenda, maravilhosa, coberta de folhas de prata, no meio das quais balançavam lindas maçãs de ouro; tão lindas como certamente não existiam iguais no mundo. Mas não sabiam de que maneira havia surgido ali, durante a noite. Somente Doisolhinhos compreendeu que a árvore surgira dos intestinos da cabra, enterrados justamente naquele lugar.
A mãe, então, disse a Olhinho:
- Minha filha, trepa na árvore e colhe algumas frutas para nós.
Olhinho obedeceu; mas, quando ia colher uma fruta, os galhos fugiam-lhe das mãos; por mais que fizesse, sempre que ia agarrar uma fruta, esta fugia-lhe e não conseguiu apanhar uma. Então a mãe disse à outra filha:
- Trêsolhinhos, vai tu; com os teus três olhos poderás ver melhor que tua irmã.
Ela trepou na árvore, mas não teve melhor êxito. Por mais que olhasse e fizesse, as maçãs de ouro fugiam-lhe das mãos e ela nada conseguiu.
A mãe acabou por perder a paciência e trepou ela mesma na árvore; mas teve a mesma sorte das filhas. Então Doisolhinhos ofereceu-se para colher as frutas. As irmãs disseram, desdenhosamente:
- Que podes fazer tu, com esses dois olhos?
Ela não se importou e trepou na árvore; mas as maçãs não se retraím dela; ao contrário, apresentavam-se espontaneamente ao alcance de sua mão de maneira que conseguiu encher o avental. A mãe tomou-lhas todas e, em vez de tratá-la melhor, como era sua obrigação, ela e as outras duas filhas, cheias de inveja, começaram a maltratá-la ainda mais.
Certo dia, encontravam-se as três moças ao pé da árvore, quando viram aproximar-se garboso cavaleiro.
- Depressa, Doisolhinhos, - exclamaram as outras. - corre, vai esconder-te debaixo do barril, pois não queremos envergonhar-nos por tua causa.
E, mais que depressa, empurraram a irmã, jogando-lhes em cima um barril vazio, escondendo também as maçãs que haviam colhido.
O cavaleiro já estava bem próximo e as duas irmãs viram que ele era muito formoso. Deteve-se ao pé da árvore e ficou a admirar os belos frutos de ouro, depois disse:
- A quem pertence esta bela árvore? Quem me der um galho dela, pode pedir-me em troca o que quiser.
Olhinho e Trêsolhinhos responderam que a árvore pertencia a elas e que de bom grado lhe davam o galho pedido. E as duas esforçaram-se, mas inutilmente, para apanhar um galho, pois este sempre lhes fugia das mãos, e, por mais que fizessem, nada conseguiram.
Então, o cavaleiro disse:
- É estranho que, pertencendo-vos esta árvore, não possais arrancar-lhe um galho!
As duas moças continuaram insistindo que a árvore lhes pertencia realmente; mas, enquanto assim falavam, Doisolhinhos empurrou para fora do barril as maçãs de ouro e estas rolaram até os pés do cavaleiro, porque a irritava ouvir Olhinho e Trêsolhinhos afirmarem o que não era verdade.
O cavaleiro ficou surpreendido ao ver aquelas maçãs rolando para junto dele e perguntou de onde vinham. Olhinho e Trêsolhinhos responderam que tinham outra irmã mas que não podia mostrar-se porque só tinha dois olhos, como a gente ordinária. O cavaleiro, porém, quis vê-la e gritou:
- Doisolhinhos, vem cá; apresenta-te!
Muito contente e cheia de esperanças, ela saiu debaixo do barril deixando o cavaleiro admirado de sua grande beleza. Este perguntou-lhe:
- Tu, Doisolhinhos, com certeza podes dar-me um galho dessa linda árvore!
- Posso, sim, - respondeu ela - porque essa árvore é minha.
Trepou, agilmente, pelo tronco acima e, sem a menor dificuldade, apanhou um galho com as mais lindas folhas de prata, carregado de frutas de ouro, e entregou-o ao moço, o qual disse:
- Que devo dar-te, em troca disto?
- Ah, - respondeu Doisolhinhos - aqui padeço fome o dia inteiro e toda espécie de maus tratos; se quisésseis levar-me embora, eu seria muito feliz.
O cavaleiro colocou-a no arção da sela e levou-a para o castelo de seu pai. Lá, mandou que lhe dessem trajes suntuosos e a melhor alimentação. Tendo-se apaixonado loucamente por ela, desposou-a em meio a grandes festas e alegria.
Quando o cavaleiro levou consigo Doisolhinhos, a sorte desta aumentou incrivelmente a inveja das duas irmãs, que se consolaram, pensando:
"Resta-nos, todavia, a árvore maravilhosa e, embora não possamos colher seus lindos frutos, ela atrairá a atenção de todos os transeuntes, que virão até cá para admirá-la; quem sabe se não teremos também uma feliz sorte?"
Mas, na manhã seguinte, viram, desapontadas, que a árvore tinha desaparecido, desvanecendo-se assim as suas esperanças. E Doisolhinhos, ao olhar para fora da janela, viu com grande alegria que a sua árvore a havia acompanhado e estava lá diante dela.
Doisolhinhos viveu longamente, muito feliz, mas, certo dia, apresentaram-se ao castelo duas mendigas pedindo esmola. Olhando para elas atentamente, Doisolhinhos reconheceu suas irmãs, Olhinho e Trêsolhinhos, reduzidas a tamanha miséria que eram obrigadas a medigar de porta em porta.
Ela, porém, acolheu-as amavelmente. E no castelo foram muito bem tratadas e assistidas, acabando por arrepender-se, sinceramente, e todo o mal causado à boa irmãzinha durante a sua juventude.

Aladim e a Lâmpada Maravilhosa



Há muitos e muitos anos viviam num distante reino da China a viúva de um pobre alfaiate e seu filho Aladim.
Um dia, quando este brincava na praça, um estrangeiro aproximou-se dele e lhe disse:
- Meu menino, você não e filho do alfaiate Mustafá ?
- Sou, sim, respondeu Aladim, mas meu pai já morreu ha muito tempo.
- Pois então eu sou seu tio, meu querido sobrinho! Há muitos anos estou viajando; desejava tanto rever meu irmão, e agora estou sabendo que ele esta morto!
Quanto sofrimento para mim! 0 estrangeiro tomou a mão de Aladim e pediu-lhe que o levasse a casa de sua mãe.
Lá entregou a boa senhora uma bolsa cheia de ouro, dizendo-lhe que fosse comprar uma comida saborosa para o jantar. Na refeição ele contou que estava viajando ha muito tempo, e descreveu todos os países por ele visitados.
No dia seguinte ele saiu com Aladim e comprou-lhe roupas riquíssimas. Depois visitaram juntos a cidade, dirigindo-se por fim aos magníficos jardins que a cercavam. Pouco a pouco foram-se afastando da cidade, chegando assim ao sopé de uma montanha.
- Paremos aqui, disse o estrangeiro, pois aqui neste lugar lhe vou mostrar coisas maravilhosas! Enquanto eu faço um fogo com gravetos, você vai buscar lenha para fazermos uma grande fogueira.
Aladim logo reuniu uma pilha de galhos secos. 0 estrangeiro acendeu então a fogueira, pronunciando palavras magicas. No mesmo instante dali levantou-se uma fumaça espessa. A terra tremeu um pouco, depois abriu-se, deixando aparecer uma pedra na qual estava presa uma argola de ferro.
0 estrangeiro suspendeu a pedra e uma escada íngreme apareceu.
- Desça esta escada, disse o estrangeiro, e quando você chegar em baixo achará um salão. Atravesse-o sem parar um instante. No meio desse salão ha uma porta que da para um jardim. No meio desse jardim, sobre um pedestal, esta uma lâmpada acesa. Pegue a lâmpada e traga-a para mim. Se os frutos do jardim lhe apetecerem, pode colhê-los à vontade.
Em seguida ele colocou um anel no dedo de Aladim, dizendo-lhe que este o protegeria contra qualquer perigo.
Aladim desceu ao subterrâneo e, sem se deter, foi e apanhou a lâmpada- Já de volta, ele parou para olhar o jardim e viu que ali havia frutas muito diferentes das outras. Colheu algumas julgando que fossem de vidro colorido, quando na realidade eram pérolas, rubis, diamantes e esmeraldas.
0 estrangeiro aguardava com impaciência.
- Meu tio, disse Aladim, ajude-me a subir, por favor. - Pois não, querido sobrinho, mas então você primeiro tem que me dar a lâmpada, pois ela lhe pode atrapalhar para subir.
- Não atrapalha não, meu tio; assim que estiver em cima, eu lhe entrego a lâmpada.
E continuaram a teimar sem que nenhum cedesse, até que por fim o estrangeiro teve um acesso de raiva pavoroso e pronunciou urnas palavras mágicas. A pedra então fechou-se sobre si mesma, e Aladim ficou prisioneiro no subterrâneo.
0 estrangeiro era um grande feiticeiro africano que por meio de suas mágicas descobrira a existência da lâmpada cuja posse poderia torna-lo mais poderoso que todos os reis da terra. Porem ele próprio não podia ir busca-la, por isso recorrera a Aladim.
Vendo que não poderia obtê-la, voltou para a África no mesmo dia.
Aladim já estava fechado no subterrâneo há três dias, quando, juntando as mãos para implorar ao céu misericórdia, sem querer esfregou o anel que o mágico lhe dera. Imediatamente um ente o medonho apareceu e disse estas palavras:
- Que desejas ? Estamos prontos a te obedecer, eu e todos os escravos do anel.
Aladim gritou :
- Sejas quem for, tira-me deste lugar!
Mal acabara de pronunciar estas palavras e logo viu-se fora do subterrâneo.
Assim que chegou à casa, contou a sua mãe o que lhe acontecera, e pediu-lhe um pouco de comida.
- Ali ! meu filho! Que tristeza! eu não tenho nem um pedaço de pão para lhe dar!
- Pois então, minha mãe, dê-me a lâmpada que eu trouxe, e eu irei vendê-la.
- Está aqui, meu filho, mas está muito suja. Vou areá-la; assim talvez dêem. mais dinheiro por ela.
Assim que começou a esfregá-la, apareceu um gênio pavoroso que disse com uma voz cavernosa:
- Que desejas? Sou teu escravo, e estou pronto a te obedecer, assim como todos os outros escravos da lâmpada.
A mãe de Aladim. desmaiou de susto.
Aladim. pegou a lâmpada e respondeu:
- Estou com fome, traz alguma coisa para eu comer!
0 gênio desapareceu e voltou trazendo em enorme bandeja de prata 12 pratos cheios de coisas deliciosas, pão e duas garrafas de um vinho finíssimo, colocando tudo sobre a mesa; depois desapareceu.
Muitos dias se passaram durante os quais Aladim e sua mãe recorreram uma porção de vezes a lâmpada.
Uma manhã, enquanto passeava, Aladim ouviu publicar uma ordem do rei obrigando o povo a fechar todas as portas e janelas das casas, porque a princesa sua filha ia sair do palácio e não devia ser vista por ninguém.
Esta proclamação despertou em Aladim grande curiosidade de conhecer a princesa; tendo-a visto, ficou grandemente impressionado por sua extraordinária beleza.
Voltando para casa, ele não pode conter seu entusiasmo e disse a sua mãe:
- Eu vi a princesa Badrulbudur. Amo-a e resolvi pedi-la em casamento.
A mãe de Aladim não pode reprimir gargalhada :
- Ora veja, meu filho ! e está sonhando!
- Não, minha mãe, não estou. E vou-lhe pedir um favor. Pegue um vaso de bom tamanho, encha-o com as frutas que eu trouxe do jardim da lâmpada, e leve o ao rei.
A mãe de Aladim fez tudo o que lhe pedira Aladim.
0 rei maravilhou-se com as pedras preciosas que ela lhe ofereceu e disse-lhe:
- Vá, boa mulher, volte para a sua casa. Diga a seu filho que eu aceito a sua proposta, e que lhe concederei minha filha quando ele me enviar 40 bandejas de ouro maciço cheias de pedras preciosas trazidas por 40 escravos negros acompanhados por 40 escravos brancos, todos vestidos luxuosamente.
Logo que sua mãe lhe contou o que se passara, Aladim chamou o gênio, e exprimiu-lhe seu desejo.
Pouco tempo depois o gênio lhe trazia os tesouros pedidos.
Aladim apresentou-se ao rei com todo seu séquito, no meio das aclamações de toda a cidade, e as núpcias se realizaram algum tempo depois com grandes festas.
Aladim mandou construir pelo gênio um palácio digno da princesa, sua esposa. 0 palácio maravilhoso ficou pronto em uma única noite. Era feito com madeiras preciosas e mármore do mais fino.
No centro, debaixo de uma cúpula maciça de ouro e prata, havia um salão com 24 janelas incrustadas com as mais belas pedras preciosas. Os jovens esposos viveram felizes alguns anos ate o dia em que o mágico, que nunca esquecia Aladim e não perdia a esperança de reaver a lâmpada maravilhosa, soube por suas feitiçarias tudo o que acontecera.
No dia seguinte ele retomou o caminho da China e chegou logo a cidade de Aladim.
Dirigiu-se imediatamente a casa de um negociante de lâmpadas e comprou-lhe uma dúzia delas. Colocando-as numa cesta, tomou o caminho do palácio maravilhoso, gritando:
- Quem quer trocar lâmpadas; velhas por lâmpadas novas!!!?
A princesa Badrulbudur ouviu-o.
- Boa idéia, disse ela as suas aias, neste canto lia uma lâmpada velha, troquem-na por uma nova!
Uma das aias logo foi e trocou a lâmpada velha pela nova.
0 mágico saiu imediatamente da cidade. Assim que ele chegou ao campo, pegou a lâmpada, esfregou-a e disse ao gênio:
- Eu ordeno que retires o palácio de onde ele esta e que o transportes para a África.
0 gênio executou imediatamente a ordem recebida. Aladim estava caçando. Quando voltou, qual não foi o seu desespero não encontrando seu palácio nem sua esposa.
0 rei, seu sogro, estava louco de raiva, e ameaçou mata-lo se antes de 40 dias não encontrasse sua filha.
Felizmente Aladim possuía ainda o anel do mágico.
Esfregou-o e o gênio apareceu.
- Que desejas ? perguntou o gênio.
- Gênio, leva-me para junto da princesa, minha esposa.
Com a rapidez de um relâmpago, achou-se ele na África, bem debaixo da janela do quarto de Badrulbudur.
Uma aia avistou-o e preveniu a princesa., que o reconheceu e ir até junto dela.
Não tiveram dificuldade em se apoderar novamente da lâmpada maravilhosa dando um narcótico ao mágico, que a trazia escondida dentro de suas roupas.
0 gênio da lâmpada logo foi chamado para transportar o palácio para o lugar onde estava antes e o pai de Badrulbudur ficou radiante, encontrando sua filha.
0 mágico foi acorrentado e jogado para servir de pasto aos animais ferozes.
Grandes festas celebraram a volta da princesa e de seu esposo. Os dois viveram muito felizes.
Aladim subiu ao trono depois da morte de seu sogro.
Reinou sabiamente com Badrulbudur durante longos e longos anos e deixaram filhos ilustres.

Os Jardins de Valhalla

(Edmundo Machado)

Conta a lenda que na morada do Criador existe um imenso jardim, chamado de Jardim de Valhala.
Neste jardim, onde o tempo não vigora, e um minuto e a eternidade convivem no mesmo momento,
ficam os espíritos bons, escolhidos pelo Altíssimo, aguardando a hora de serem enviados à Terra para cumprirem sua missão.
No Jardim de Valhala dois espíritos, um chamado Danjar e outro chamado Kandata, ficaram por tempos e tempos, surgindo um amor profundo entre ambos. Um amor puro, fraternal, que os unia com uma força superior à própria força do amor.
Danjar e Kandata estavam sempre juntos.
Um era a alegria do outro, e, por um fenômeno que o mero conhecimento humano não explica, um brilho descomunal reluzia sobre os dois quando estavam lado a lado.
A alegria que os dois espalhavam contagiava os demais espíritos e os dois transformaram-se na essência do jardim.
Um dia, Danjar foi enviado à Terra.
Kandata, à princípio, ficou muito feliz em saber que o seu inseparável companheiro tinha, finalmente, sido enviado para cumprir sua missão, porém, aquela alegria de primeiro momento foi se transformando em uma tristeza profunda.
O Jardim de Valhala, de um instante para outro passou a não ter mais sentido. Nada mais tinha sentido. Até o brilho de Kandata foi morrendo e ela passou a ser a imagem viva da dor.
Os outros espíritos de tudo fizeram para que a alegria de Kandata voltasse e nada conseguiram.
A dor de Kandata era tão profunda que os outros espíritos, compadecidos de seu sofrimento,
resolveram enviá-la à Terra, mesmo sem ser a hora certa, para que ela pudesse procurar e
encontrar Danjar, e, se possível levá-lo de volta ao jardim.
Tomando Deus conhecimento da rebeldia de Kandata, deu-lhe um castigo:
Ainda que ela estivesse na Terra, nunca encontraria Danjar, vez que ele estaria sempre em lugar diferente do dela e ela jamais poderia trazê-lo de volta ao Jardim de Valhala.
Kandata então, em um gesto desesperado, dividiu seu amor em infinitos pedaços e implantou cada pedaço em um novo espírito que viesse à Terra, pois assim, não só ela, mas centenas de espíritos procurariam por ele e algum poderia encontrar Danjar.
Como cada um deles levava parte do amor dela, um dia uma parte dela estaria junto daquele que ela tanto amava.
Kandata dividiu-se e dividiu-se tanto, que dela nada mais restou senão a lembrança.
Assim, quando duas pessoas se encontram e sem qualquer explicação, um laço profundo de amor surge entre ambos, é um pedaço do amor de Kandata que encontrou na outra pessoa, um pedaço do brilho de Danjar.

Os Sete Anões do Arco-Íris



Há muitos e muitos anos, quando a Terra ainda estava sendo criada, Nosso Senhor chamou sete anjos e deu-lhes uma ordem: cada um teria que cuidar de um elemento no planeta. Cada anjo recebeu uma vestimenta de uma cor diferente, de acordo com suas atribuições.
O primeiro anjo a ser chamado foi o que vestia uma túnica encarnada, pois o encarnado era a cor dos sentimentos. Este era, com efeito, o anjo encarregado de cuidar dos corações dos filhos de Deus. Amor, amizade, alegria, todos eram sentimentos que o anjo teria que suprir aos homens. Para tanto, Nosso Senhor entregou-lhe um baúzinho onde estavam todos os bons sentimentos.
Mas o Criador deu-lhe também um cofre onde estavam encerrados todos os maus sentimentos, como a inveja, a cobiça, a raiva, a preguiça, o mau-humor. Ainda bem que esse cofrinho vivia sempre trancado mas os maus sentimentos, assim como os maus pensamentos, sempre arrumavam um jeitinho, uma brecha, por menor que fosse, para vir atormentar os homens...
O segundo anjo estava vestido em laranja e seria ele quem cuidaria das frutas. O anjo seria o responsável em comandar o tempo certo de cada uma nascer, crescer e amadurecer. Nenhuma fruta no mundo devia ficar madura antes do tempo, foi o que mandou Nosso Senhor. O anjo laranja também devia trazer alegria aos homens da terra sempre que balançasse os galhos carregados de deliciosas frutas, espalhando seu delicado perfume pelo ar. Seu instrumento de trabalho era uma cestinha de jardineiro, cheia de sementes de tudo quanto é fruta que Nosso Senhor queria que crescesse na Terra.
O terceiro anjo trazia uma túnica amarela como os raios do sol e era justamente por isso que Deus mandou que ele cuidasse do astro-rei. O anjo amarelo devia, a partir dali, acordar bem cedinho para despertar o sol para o trabalho diário de aquecer o mundo. Era ele ainda que mandaria que o sol se deitasse mais tarde, no verão, ou mais cedo, no inverno. O anjo amarelo era também quem media a temperatura do sol, para que este não brilhasse muito forte e acabasse queimando os filhos de Deus. O anjo amarelo carregaria, por isso, um enorme termômetro de ouro.
O quarto anjo vestia uma comprida e vistosa túnica verde e seria ele o responsável pelas florestas. O anjo teria que cuidar para que todas as plantinhas crescessem para manter o planeta um bom lugar para os filhos de Deus. Cada folhinha, cada brotinho que nasceriam no mundo teriam todo o cuidado e atenção do anjo verde. Para cumprir sua tarefa, o anjo verde ganhou um bastão com uma enorme esmeralda mágica, que fazia tudo crescer e verdejar.
O quinto anjo, por sua vez, estava vestido em azul, pois azul era a cor do seu elemento. Este anjo seria o responsável pelas águas do nosso planeta. Cada fiozinho de água, seja um regato, um riacho, um rio, um mar ou mesmo um oceano deveriam obedecer a ele. As marés altas e baixas, e até mesmo as enchentes, nada acontecia sem ele saber e mesmo sem ele mandar. Tudo devia ser conforme a vontade de Nosso Senhor. Nas mãos, o anjo azul carregava um cálice de cristal com a mais pura água, retirada da fonte sagrada que existe no céu. Este cálice era mágico pois por mais que o anjo usasse sua água para abastecer a Terra, ele nunca secava.
O sexto anjo estava vestido com uma túnica anil e seria ele o responsável pelas nuvenzinhas que coroam o nosso céu. Era ele que devia comandar os raios e trovões, sempre que Nosso Senhor assim o mandasse, aqui na Terra. E era ele ainda que iria mandar os ventos soprarem forte ou fraquinho, como uma suave brisa, ou ainda comandá-los como violentos tufões e furacões nas batalhas contra os espíritos maus e contra os dragões que sempre tentavam roubar a esperança dos homens. Seu instrumento mágico era um sino, que deveria ser tocado conforme a força e a intensidade dos ventos que deviam soprar sobre o planeta.
O último anjo, o mais lindo de todos, trazia uma túnica brilhante, num magnífico tom violeta. A cor era tão forte que quase chegava a ofuscar os olhos! Nosso Senhor deixou-o por último de propósito. Cada elemento na Terra já tinha seu anjo guardião. Mas faltava algo. Quem iria cuidar dos sonhos dos homens? Esta, disse Deus, seria, pois, a missão do anjo violeta.
Sempre que cada filho de Deus dormisse, ele devia ficar bem pertinho para encaminhar os sonhos de cada pessoa até o Pai celeste, que então via o desejo de cada um de seus filhos e decidia o que poderia ser feito. Ninguém podia ficar de fora, pois todos os sonhos, seja do pobre ou do rico, do feio ou do bonito, deviam ser levados ao Senhor.
O anjo dos sonhos recebeu um imenso cristal violeta em forma de estrela que deveria ser colocado na testa do sonhador.
Feito isso, Nosso Senhor mandou que todos se pusessem ao trabalho e aquele foi um dia muito feliz no céu e na terra.
E para lembrar aos homens que o Pai jamais se esquecia deles, sempre que a fé e a esperança diminuíssem em seus corações, Deus mandava os anjos se darem as mãos e entoarem um hino de louvor, formando um lindo arco-íris no céu, lembrança viva do amor do Pai Eterno pelos seus filhos na Terra.


Gabriela Kopinits

Uma Verdadeira Princesa



Num país muito longínquo, havia um príncipe que só queria casar com uma verdadeira princesa. Deu a volta ao mundo em busca de uma e, apesar de não faltarem princesas, nunca tinha confiança na antigüidade da sua nobreza; sempre havia nelas qualquer coisa que lhe parecia suspeito.
Isto deu em resultado voltar para o seu país muito desgostoso por não ter encontrado o que desejava.
Certa noite, fazia um tempo horrível; os relâmpagos cruzavam-se no céu, o trovão ribombava, a chuva caía em torrentes.
Bateu alguém à porta do palácio e o velho rei apressou-se em mandar abrir.
Era uma princesa que vinha fugindo, perseguida por alguns rebeldes do seu país que acabavam de destronar a família real. Mas, Deus!, de que maneira a tinham posto a chuva e a tempestade! A água escorria-lhe pelo vestido.
No entanto, apresentou-se como uma verdadeira princesa, sem faltar a uma só das regras de etiqueta palaciana.
"Daqui a pouco saberemos se és ou não uma verdadeira princesa", pensou a velha rainha.
Em seguida, sem dizer nada a ninguém, entrou na alcova, desfez a cama e pôs uma ervilha sobre as tábuas. Depois estendeu vinte colchões sobre a ervilha e ainda mais vinte edredons que colocou em cima dos colchões.
Era aquela a cama destinada à princesa.
Na manhã seguinte, a rainha entrou pressurosa em companhia do filho, e ambos lhe perguntaram com grande interesse como tinha passado a noite.
- Muito mal. - respondeu. - A noite toda quase não fechei os olhos! Havia nesta cama qualquer coisa que me deixou a pele com nódoas negras.
Por esta resposta, os reis e o príncipe se convenceram de que ela era uma verdadeira princesa.
O príncipe casou com ela, e a ervilha foi mandada para um museu, onde ainda se deve conservar sob uma urna de cristal, se ninguém a
Furtou...

Uma Fábula Sobre a Fábula



Allahur Akbar! Allahur Akbar!
(Deus é Grande)
Quando Deus criou a mulher, criou também a Fantasia. Um dia, a Verdade resolveu visitar um grande palácio. E havia de ser o próprio palácio em que morava o sultão Harum Al Raschid.
Envoltas as lindas formas num véu claro e transparente, foi ela bater à porta do rico palácio em que vivia o glorioso senhor das terras muçulmanas. Ao ver aquela formosa mulher, quase nua, o chefe dos guardas perguntou-lhe:
- Quem és?
- Sou a Verdade! - respondeu ela, com voz firme. - Quero falar ao vosso amo e senhor, o sultão Harum Al-Raschid, o sheik do Islã!
O chefe dos guardas, zeloso da segurança do palácio, apressou-se em levar a nova ao grão-vizir:
- Senhor - disse, inclinando-se humilde -, uma mulher desconhecida, quase nua, quer falar ao nosso soberano, o sultão Harum Al-Raschid, Príncipe dos Crentes.
- Como se chama?
- Chama-se a Verdade!
- A Verdade! - exclamou o grão-vizir, subitamente assaltado de grande espanto. - A Verdade quer penetrar neste palácio! Não! Nunca! Que seria de mim, que seria de todos nós, se a Verdade aqui entrasse? A perdição, a desgraça nossa! Diz-lhe que uma mulher nua, despudorada, não entra aqui!
Voltou o chefe dos guardas com o recado do grão-vizir e disse à Verdade:
- Não podes entrar, minha filha. A tua nudez iria ofender o nosso califa. Com ares impudicos não poderás ir à presença do Príncipe dos Crentes, o nosso glorioso sultão Harum Al-Raschid. Volta pois, pelos caminhos de Allah!
Vendo que não conseguiria realizar o seu intento, ficou muito triste a Verdade, e afastou-se lentamente do grande palácio do magnânimo sultão Harum Al-Raschid, cujas portas se fecharam à diáfana formosura!
Mas…
Allahur Akbar! Allahur Akbar! (Deus é Grande)
Quando Deus criou a mulher, criou também a obstinação. E a Verdade continuou a alimentar o propósito de visitar um grande palácio. E havia de ser o próprio palácio em que morava o sultão Harum Al-Raschid…
Cobriu as peregrinas formas de um couro grosseiro como os que usam os pastores e foi novamente bater à porta do suntuoso palácio em que vivia o glorioso senhor das terras muçulmanas.
Ao ver aquela formosa mulher grosseiramente vestida com peles, o chefe dos guardas perguntou-lhe.
- Quem és?
- Sou a Acusação! - respondeu ela, em tom severo. Quero falar ao vosso amo e senhor, o sultão Harum Al-Raschid. Comendador dos Crentes.
O chefe dos guardas, zeloso da segurança do palácio, correu a entender-se com o grão-vizir.
- Senhor - disse, inclinando-se humilde -, uma mulher desconhecida, o corpo envolto em grosseiras peles, deseja falar ao nosso soberano, o sultão Harum Al-Raschid.
- Como se chama?
- A Acusação!
- A Acusação? - repetiu o grão-vizir, aterrorizado. - A Acusação quer entrar neste palácio? Não! Nunca! Que seria de mim, que seria de todos nós, se a Acusação aqui entrasse! A perdição, a desgraça nossa! Diz-lhe que uma mulher, sob vestes grosseiras de um zagal, não pode falar ao Califa, nosso amo e senhor.
Voltou o chefe dos guardas com a proibição do grão-vizir e disse à Verdade:
- Não podes entrar, minha filha. Com essas vestes grosseiras, próprias de um beduíno rude e pobre, não poderás falar ao nosso amo e senhor, o sultão Harum Al-Raschid. Volta, pois, em paz, pelos caminhos de Allah.
Vendo que não conseguiria realizar o seu intento, ficou ainda mais triste a Verdade e afastou-se vagarosamente do grande palácio do poderoso Harum Al-Raschid, cuja cúpula cintilava aos últimos clarões do sol poente.
Mas…
Allahur Akbar! Allahur Akbar! (Deus é Grande)
Quando Deus criou a mulher criou também o capricho.
E a Verdade entrou-se do vivo desejo de visitar um grande palácio. E havia de ser o próprio palácio em que morava o sultão Harum Al-Raschid.
Vestiu-se com riquíssimos trajes, cobriu-se com jóias e adornos, envolveu o rosto em um manto diáfano de seda e foi bater à porta do palácio em que vivia o glorioso senhor dos Árabes.
Ao ver aquela encantadora mulher, linda como a quarta lua do mês de Ramadã, o chefe dos guardas perguntou-lhe:
- Quem és?
- Sou a Fábula - respondeu ela, em tom meigo e mavioso. - Quero falar ao vosso amo e senhor, o generoso sultão Harum Al-Raschid, Emir dos Árabes!
O chefe dos guardas, zeloso da segurança do palácio, correu, radiante, a falar com o grão-vizir.
- Senhor - disse, inclinando-se, humilde -, uma linda e encantadora mulher, vestida como uma princesa, solicita audiência de nosso amo e senhor, o sultão Harum Al-Raschid, Emir dos Crentes.
- Como se chama?
- Se chama Fábula!
- A Fábula! - exclamou o grão-vizir, cheio de alegria. - A Fábula quer entrar neste palácio! Allah seja louvado! Que entre! Bem-vinda seja a encantadora Fábula. Cem formosas escravas irão recebê-la com flores e perfumes. Quero que a Fábula tenha, neste palácio, o acolhimento digno de uma verdadeira rainha!
E abertas de par em par as portas do grande palácio de Bagdá, a formosa peregrina entrou.
E foi assim, sob o aspecto da Fábula, que a Verdade conseguiu aparecer ao poderoso califa de Bagdá, o sultão Harum Al-Raschid, Vigário de Allah e senhor do grande império muçulmano.

Rumpelstiltskin



Vivia em certo reino um pobre moleiro com uma filha lindíssima, sagaz e talentosa. Era o moleiro tão gabola e estava tão orgulhoso da filha, que disse um dia ao rei ser esta capaz de tirar fios de ouro se a pusessem a fiar palha.
O rei era muito invejoso e, ao escutar a fanfarronada do súdito, ordenou que a jovem fosse conduzida à sua presença. O monarca levou-a a uma sala onde havia grande quantidade de palha. Deu-lhe uma roca e disse-lhe:
- Se tens algum amor à vida, fia toda essa palha até amanhã, transformando-a em fios de ouro.
De nada valeu à pobre moça afirmar que não podia realizar tal maravilha; a sala foi fechada com sete voltas de chave e a jovem ficou sozinha.
Presa da maior aflição, deixou-se cair numa cadeira e desatou a chorar perdidamente; mas eis que, sem saber como, se abre a porta e entra, coxeando, um homenzinho ridículo, que lhe diz:
- Bom dia, minha filha. Por que choras?
- Ai! - soluçou a desgraçada, - porque tenho que fiar toda esta palha, transformando-a em fios de ouro, e não sei como o hei de fazer.
- Que me darás tu se eu o fizer?
- Dar-te-ei o meu colar.
Fiou-se o anão na palavra e pôs-se, em seguida, a dar voltas à roca; e assim, cantando alegremente, em breve todo o montão estava transformado em reluzentes fios de ouro fino.
Quando, no dia seguinte, o rei entrou no quarto ficou surpreendido e encantado ante aquele espetáculo fantástico; mas a sede do ouro despertou em seu coração e tornou a encarcerar a infeliz moça, encomendando-lhe nova tarefa.
A jovem, aterrorizada, pôs-se a chorar outra vez, mas o anão apareceu de novo e disse-lhe:
- Que me darás tu se eu o fizer?
- O anel que trago no dedo. - respondeu ela.
O anão ficou com o anel, e sentou-se pela segunda vez diante da roca; e, depois de trabalhar algumas horas, a palha ficou transformada em fios de ouro.
O rei sentiu extraordinário regozijo ao contemplar aquele brilhante tesouro; mas, não satisfeita ainda sua cobiça, levou a filha do moleiro a uma sala ainda mais ampla, e disse-lhe:
- Toda esta palha deve ser transformada em ouro durante a próxima noite, e, se te saíres bem da empresa, amanhã serás minha esposa.
Quando a jovem ficou sozinha, apareceu o anão que lhe disse:
- Que me darás se me encarregar da tarefa?
- Já nada tenho. - respondeu, afogada em pranto, a infeliz.
- Promete-me, então, que me darás o primeiro filho que tiveres quando fores rainha.
Pensou ela que talvez não tivesse filhos, e, mesmo como não via outra solução, acedeu ao desejo do homenzinho, o qual fiou também o terceiro montão de palha, transformando-o, por completo, em fios de ouro.
No dia seguinte, o rei voltou e, em face do que viu, casou com a maravilhosa jovem. O primeiro filho que veio alegrar aquele palácio encheu a rainha de tão completo regozijo, que esqueceu por completo a promessa; mas um dia o anão apresentou-se no palácio e exigiu-lhe o cumprimento da palavra.
Em vão lhe oferecia ela todos os tesouros do reino em lugar do filho; suas lágrimas, por fim, conseguiram comover o homenzinho, que lhe disse:
- Se ao fim de três dias fores capaz de acertar o meu nome, devolver-te-ei a palavra.
Não pôde a rainha conciliar toda a noite o sono, pensando nos nomes mais raros que jamais ouvira, e enviou por todo o país mensageiros que trouxessem outros novos.
Quando, no dia seguinte, o anão apareceu, começou a rainha a chamar-lhe por quantos nomes pôde recordar; mas a todos respondia ele:
- Não é esse meu nome.
No segundo dia, começou a rainha a chamá-lo pelos nomes mais estrambólicos que tinha ouvido em toda a sua vida; mas o anão respondia:
- Não me chamo assim.
Por fim, no terceiro dia, regressou um dos mensageiros que a rainha mandara a tomar nota de nomes extraordinários, e disse à sua soberana:
- Ontem à noite, quando eu escalava uma colina, escondida entre as árvores da mata, descobri uma miserável cabana, a cuja porta ardia uma fogueira, e em torno desta dançava, em um dos pés, um homenzinho ridículo que cantava esta canção:
Rum rom rim rem ram
Pels pils pols puls pals
Til tol tul tal tel
Ts ts ts ts ts
Kin kon kun kan ken
- Decorei a trapalhada - continuou ele - e pus-me a pensar no que poderia significar. Afinal, descobri.
Deu, então, o significado à rainha, que ficou satisfeitíssima, e no dia seguinte, quando o anão apareceu, foi-lhe dizendo:
- Teu nome é João?
- Não - respondeu o homenzinho.
Ela fingiu que pensava e que estava aflita por acertar.
- José?
- Não.
- Henrique?
- Não.
Teve um momento de receio. E se houvesse engano na informação que havia recebido? De qualquer forma estaria perdida, irremediavelmente perdida. E, agora, não titubeou mais.
- Então, - disse a rainha - só pode ser Rumpelstiltskin!
A surpresa do anão foi extraordinária. Nunca tinha pensado que a rainha poderia descobrir seu nome e ficou furioso.
- Só uma bruxa te poderá ter dito o meu nome! - gritou furibundo o anão, dando tal pancada com o pé no solo que, para o desenterrar, teve que empregar a força das duas mãos.
Solto o pé, Rumpelstiltskin desapareceu no ar, como por encanto, e a rainha pôde, enfim, respirar aliviada. Seu filhinho estava salvo!

Os Elfos e o Sapateiro



Era uma vez um sapateiro honesto que era muito pobre. Ele trabalhava tanto quanto podia e ainda assim não conseguia ganhar o suficiente para manter a si e à esposa. Até que chegou um dia em que ele não tinha nada além de um pedaço de couro, grande o suficiente para fazer um par de sapatos. Ele cortou os sapatos, deixando-os pronto para costurar, e os colocou no banco; então, ele disse as suas orações e foi dormir, confiante que ira terminar os sapatos no outro dia e vendê-los.
Cedinho na manhã seguinte, ele se levantou e foi para a banqueta de trabalho. Lá havia um par de sapatos, lindamente feitos, e o couro havia desaparecido! Não havia nenhum sinal de que alguém ali tivesse estado. O sapateiro e sua esposa não sabiam o que pensar disso. Mas o primeiro cliente que veio ficou tão encantado como os belos sapatos que imediatamento os comprou e pagou tanto dinheiro que deu para o sapateiro comprar couro suficiente para dois pares.
Alegremente, ele os cortou e, como já era tarde, deixou os pedaços na banqueta, prontos para serem costurados na manhã seguinte. Mas quando a manhã veio, dois pares de sapatos lindamente feitos o aguardavam no lugar do couro que ele havia deixado lá e não havia sinal algum de qualquer pessoa que ali tivesse estado. O sapateiro e sua esposa estavam boquiabertos.
Naquele dia, um cliente veio, comprou os dois pares e, como gostou tanto deles, pagou mais do que o sapateiro pediu, dando dinheiro suficiente para quatro pares.
Mais uma vez, ele cortou os sapatos e deixou-os na banqueta. E de manhã, lá estavam mais quatro pares feitos.
Isso continuou até que os sapateiro e sua esposa se tornaram prósperos. Mas eles não estavam satisfeitos por terem tanto feito por eles e não saberem a quem agradecer. Então, uma noite, depois que o sapateiro deixou os pedaços de couro na mesa, como de costume, ele e sua esposa se esconderam atrás da cortina e deixaram uma luz na sala.
Assim que o relógio soou as doze badaladas, a porta se abriu suavemente e dois pequeninos elfos entraram dançando, pularam no banco, subiram na mesa e começaram a costurar os pedaços do couro. Eles estavam nús, mas tinham pequenas tesourinhas e martelos e linha e trabalhavam rapidamente.
Em pouco tempo, todos os sapatos foram costurados e terminados. Então, os pequenos elfos se deram as mãos e dançaram ao redor dos sapatos na mesa. Tão engraçado aquilo foi que o sapateiro e sua esposa tiveram que fazer força para não rir. Mas o relógio soou as duas horas e os pequenos seres sumiram pela janela, deixando a sala como estava.
O sapateiro e a esposa se entreolharam e disseram:
- Como nós podemos agradecer aos pequenos elfos que nos trouxeram tanta alegria e prosperidade?
- Eu gostaria de fazer algumas belas roupinhas para eles, - disse a esposa - eles estão nus!
- E eu vou fazer os sapatinhos se você fizer os casacos. - disse o marido.
Naquele mesmo dia, eles fizeram o que prometeram. A esposa cortou dois pequenos casaquinhos verdes, dois coletes amarelos, dois pares de calças brancas, dois chapeuzinhos vermelhos (pois todos sabem que os elfos adoram cores vivas), e o marido fez dois pares de sapatinhos pontudos. Eles fizeram as roupinhas com tanto capricho quanto puderam, com pequenas costuras e lindos botões, e, pelo Natal, já estava tudo pronto.
Na véspera do Natal, o sapateiro limpou a mesa e, em vez de couro, ele colocou os dois conjuntos de roupinhas e sapatinhos. Então, ele e a esposa se esconderam, como antes, para observar.
Pontualmente à meia-noite, os pequenos elfos nus apareceram. Pularam no banco, subiram na mesa, mas quando viram as roupinhas lá, eles riram e dançaram de alegria. Cada um pegou sua roupinha e começou a vesti-la; calçaram os pequenos sapatos e então se olharam, fazendo todo tipo de estripulias de tão contentes que estavam. Por fim, eles começaram a dançar e quando o relógio bateu as duas, eles desapareceram pela janela.
Eles nunca mais voltaram mas, daquele dia em diante, deram tanta sorte ao sapateiro e à sua esposa que eles nunca mais precisaram de ajuda...